quarta-feira, 26 de outubro de 2011

dor solene

a
chamando
cantando
o sol dou
rando
meu pranto

b
e vái mor
rer no mar
pra renascer
num corpo que não cabe
no corpo

c
(na vala dos esquecidos)

ouve o canto de quem chama
uma dor so
lene

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Em sonho

em sonho voava
sinal da glória do ego
hora de lavar o banheiro.

em sonho uma cobra
sinal da frieza
hora do cuidado.

em sonho poema
sinal da fraqueza
hora da mudança

um poema-lembrete
em sonho,
esquecimento da hora
tesouro da palavra
riqueza da pronúncia.

esquecimento da horação
invento do corpo
corpo a todo instante...

...em sonho: momento de glória do poema
em vida
momento da glória do Simples
momento do corte da raiva
instante preciso em sonho

usar energia gerando energia
agir consciente
fuga do ato mecânico
busca pelo trabalho atômico
fuga da morte

poema-lembrete: a hora do barco
lembrança dos nove meses
choro em busca da mãe
mãe em busca do choro
a todo momento: atenção
a todo momento símbolo

seguir com o máximo esforço
em busca da plenitude
ing

seguir desinteressado
despretencioso
iang

organização gera potência
organização gera liberdade
organização gera felicidade

buscar organizar é voltar ao passado
que é presente em sonho

há natureza em tudo
tal como é uma palavra de inconcebível tradução
tal como é um erro ser palavra
tal como ser palavra é sempre erro
e o erro está junto ao acerto
mas ainda é erro

guarda este ramo de lírios sem fim

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

poema de um perdido

Ah, aquelas pernas...
se não fosse por elas! mas,
acho que nunca vou ter aquelas pernas entre as minhas mãos.
mesmo que minhas mãos sejam fortes
mesmo que as pernas estejam fracas
mesmo que eu trate de me cuidar
e bole alguma espécie de plano...

ah, aquelas pernas!
cruzadas daquela forma lembram um bosque
lembram uma árvore monumental
que cresce se contorcendo
virando os seios na minha direção.
Ter aquelas pernas
que responsabilidade
que fardo.
aquelas pernas são quase um país,
só imagine
ser uma presidente ou um rei
das tuas pernas,
ter de manusear
controlar
administrar...não! não...

prefiro ser um transeunte
que ao largo de uma avenida
avista uma árvore num bosque
e passeia entre as pernas
como um ninguém,
observando
abraçando
beijando
num segundo entre 500 anos de vida
dum monumento orgânico
no meio da noite
no meio da dor
de não te-las,
como outro já tinha ...

desde o século dezenove
há  mais grave dor
do que a minha?

creio que sim...

domingo, 26 de junho de 2011

a cor da parede
a planta da calçada
a cor do vestido da professora
o cheiro do banheiro
a temperatura da cantina
a densidade do refeitório
a umidade depois da chuva
a língua presa do porteiro
a vesguice do Zeca
o grito rouco da diretora
o cio do gato do vizinho de noite
a areia do brinquedão
a voz cinza da professora
o sorriso da nuvem
o gosto da pedra
a água da privada
o mijo na porta
o cuspe do segundo andar
o choro de arrependimento
a risada maldosa
o soco no dente
o roxo no olho
a banguela do Tomás
o osso pontudo do André
o revezamento frenético de goleiros
a comida da Dona Maria
a Pitchula
o cuspe roxo alienígena
a trupe dos ratos
a poção do camehamehá
a mentira consciente

infância

a briga com o Pedro
a lancheira do Bruno
a turma da tarde
a richa entre-turmas
o pega-pega-camikasi
a censura
a travessura
o gosto da areia
o grão no dente
o lixo nas mãos

infância

as fezes nas mãos
o mijo na porta
o soco no Tomás
um dente quebrado
o soco no Lucas
um roxo na têmpora
a briga de leão com o Pedro
o esquecimento

infância

as Julias
os Pedros
o tomáz
o joão
o vini
o matheus

infância

a Elô
o olho azul da Elô
o bebê da Elô

infância

A Ló
a fuga
o riso

infância

tempo branco
feito de luz

infância

fonte de tudo: infância

quinta-feira, 16 de junho de 2011

intérmino



viver intensamente, a Vida, nada
que uma vela não queime
num piscar noss'alma é um prego, um
botão, dez contos, uma mulher;
passa em marcha lenta
e no Tejo há barcos de todos os tipos:
se há vento, ora! moveremo-nos,
e o tempo há de consumir a dor.

Um corvo traça o Arco da Morte
sob nossa nau, no espelho d'água
nos grita velhas gralhadas;
incita lembranças da Eternidade

Uma névoa agita nosso destino
nosso barco está sempre n'água
mas a tripulação distraída pensa que o casco é a Terra
pensa que a vida no Tejo é vida qualquer
pois é engano
uma tempestade nos ensina!
um sonho nos fere as têmporas!
o Cais nos assusta...
a boa-ventura em mar é-nos a Vida.

viver intensamente, a Vida, me disse
velho pirata caolho
nada que não queime uma vela da Urbe
um marinheiro se perde no concreto
e se julga fora do Mar
pois é engano
o mar esteve sempre dentro de seu peito
e sua ruína está no esquecimento
Do Tejo ao Umbigo.
esqueceu-se
navegante,
que o movimento dos barcos
é proveniente da pré-vida?
os barcos são oriundos da barriga de uma Mãe?
e um Homem é navegante pois desde antes-do-sempre
esteve imerso nas águas
no balanço das ondas
do caminhar de sua mãe.

Onde estão agora os navegantes?
com que sinais secretos eles se comunicam?
viver intensamente, ah! será sempre um desejo?
quê faremos de importante, trupe, se ficarmos
às cegas, cobertos de mofo?
e estes corpos que temos?
Homem Ao Mar!
...entregou-se à gélida Ignorância.

Às amarras que nos dominam
aos nós que criamos:
só dedico meus risos: profanos
até o leito de minha morte
se a Vida é isto
pois é engano.

terça-feira, 7 de junho de 2011



I

luta cor de cobre em penumbra
a luta de dois corpos indecisos
decididos por lutar, em fuga da morte
proibidos de balbuciar qualquer sinal de verbo
...suas bocas somente se movem para ir de encontro
e desencontro;
descompasso

II

cisão

giro: sobre meu problema me mantenho
girando
cuspindo fogo - flamejando
suavemente atraindo a morte
que não é nada se não uma estrada
que se aproxima infinitamente da eternidade

III

eixo
luz
passo

terça-feira, 17 de maio de 2011

Poema Cinza

Um lagarto caminha devagar
como se caminhar fosse viver.
Um lagarto verde sobre o chão laranja-cobre
caminha mecanicamente sobre
a Terra.

Não há Razão ou Amor
como há para nós...ele caminha:
vamos indo.

Suas unhas fazem rastros minúsculos
que um outro verá
a procura de comida:
o lagarto será comida.

Onda havia lagarto
há comida
de coruja
ou gavião.

terça-feira, 10 de maio de 2011

As Sombras São Flores

caminham como espinhos
mugindo como ferro
rangendo num linólio vermelho
cuspindo e suspirando um rastro
de sangue seco

no canto está um tesouro

nas sombras está a loucura
sob as cortinas grossas
no meio da floresta
cheia de corujas encardidas

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Cheio de Dicas


imã
tumba dourada
gravidade em seus seios
um fio de metal atravessa
seu nariz
um fio une nós vermelhos

na água
lentamente
na água
novamente
sua mão se duplica

se amplia quando atravessa minha costela
e roça as unhas dentro do meu pulmão

preciso escovar os dentes
e comprar desodorante;

toda quinta me barbeio
está combinado
toda quinta coloco roupas limpas e engomadas

segunda feira
posso ser preso
...estranho; pois já estou meio
preso

linha de trem 93
na estação um aceno
um pano de minúsculas flores vermelhas
com nós na ponta
ao vento;

um sorriso pula da beirada
e vira choro
sempre o trem está indo
nunca chegando

um sonho
dois anéis se cruzam
é o homem e o mundo

uma tartaruga grita
uma coruja toca um violão ao luar
as corujinhas suspiram ao som do violão
ao vento;

um nó de corda erudita
uma mó feita de mulheres de madeira
uma silenciosa montanha de estrelas atrasadas

uma pássaro forte grita: manoel! onde está
nosso pão manoel?
tem mão robustas e calejadas
de gravurista

unhas pontas secas
palmas secas mergulhadas no ácido fraco

ondas douradas de ônibus
uma canoa viajou o brasil todo
meio distraída

um pardal finge que é um gavião

Eu te quero.
você mesma.
isso. será que é você? não, você não, você. sempre.

vermelha
lua
crescente
tatear
ana
aqui está meu celular: 94
15 54 10

de quinta, já é;
estou mais apresentável
no mais o sovaco não está lá aquelas coisas
mas sou eu meu cheiro, afinal

cabelo dançante
como um compasso pegando fogo

eu entendi
em sonho posso explicar
um verso por dia

cheque-mate
chá sem açucar
mola feita de melão
um bisturi assoviando
caminha do umbigo à
boca do bucho

ó meu brasil
amém

Horas Vaga(i)s



horas agora vagais
rio do tempo...aonde vamos?
2011 é mofo
um colar que se rompe no tempo circular
tomado de lama, rompido por um cutelo silencioso.
que faremos após ler estes livros?
e o quando após nossas brigas?

o que é esta tarde não está coerente;
importa onde aparece
não o que é

uma pintura não é um ventinho gozado
não é um orgasmo dentro de uma sala verde
vida é trabalho

nossas unhas crescentes no céu
estão rangendo no entre-dedos
usemo-las a cavar nosso chão
e achar nossa glória feita de mofo

um fio que é um pio
uma coruja macabra canta a existência
de uma sala negra

tudo é tudo
o belo e o bizarro
o moral e o mortal
a morte e o teatro
a morte se conforma
no canto de uma coruja

vamos dar um beliscão na bunda dos cérebros.

(imagem ao topo: pintura de Luise Weiss, retirada do seu blog Relatos Poéticos)

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Cartas de Argila II


lembremos!
passou desapercebida uma deusa
pois ela usava uma manta suja
e seu rosto espetacular notava-se apenas quando ela dançava
entre flores seus pés arrastavam poeira
e seu rastro no chão era uma mensagem divina
escondida pelos pés dos transeuntes.
lembremos dessa mensagem como
Desculpe amor, eu não lavei nossa louça
e esqueci minha aliança no parapeito da pia
tudo abaixo era abismo
de profundidade medida por uma população da china
homem sobre homem
chorando as lágrimas do luto do matrimônio.
de quê lembremos?
toda a fantasia sob pingos graúdos d'água
pingos quentes
escorrendo sobre a face da pedra
sobre a face da pele elipsada
da musa que nos apadrinha.
qualquer coisa que nos toque, lembremos.
avante lembremos também que guardamos nossas cartas
numa gaveta mofada esquecida desconsiderada
e as cartas hoje não tocam nos seios das mulheres.
lembremos de responder às cartas dos apaixonados,
caso ocntrário amantes se convertem em paranóicos
maníacos desesperados depressivos
com as olheiras como arcos fundos, pretos.
a todos que cativamos apadrinhamos
e são nossos filhos quem cativamos.
paratanto quem nasce belo
é padroeiro dos olhos de seu caminho,
é pai de todos.

(imagem ao topo: da série "Sobreposições", 1999, de Luise Weiss. retirada de seu blog Relatos Poéticos)

domingo, 24 de abril de 2011

Claro em Noite IV

virei (mais uma vez) a noite

de ponta à cabeça e vice-versa

e quando olhei ao relógio

olhando também à janela

fiquei em dúvida cruel

estaria tarde demais

ou muito cedo?

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Cartas de Argila





olá V. 
desculpa demorar tanto em te mandar isso, mas eu odeio não terminar as coisas que comecei, e tbm guardar meus sonhos só pra mim. 
pra reforçar: eu levo a sério meus sonhos, e apesar da internet ser uma coisa meio informal, eu acho que ela pode ser um meio legal de correspondência.

Foi o seguinte: numa festa por acaso eu te encontro, e desde o princípio da festa quero te encontrar. te encontro. Você me desdenha - lembre-se que é um sonho - e dificulta as coisas. durante toda a festa eu te procuro, você só me foge. fica assim o sonho todo. só no final, depois de bastante esforço eu consigo um beijo e confiança. a festa é mais alegre e todos gritam, entre risos e confetes, enquanto falo com você rosto-a-rosto. 

foi basicamente isto. claro que mais intenso e mais bonito, mas em termos gerais foi isso. 

***

bom, eu não te conheço nem um pouco, e tbm não quero q vc me ache um louco. mas apesar disso, eu acho que todo nós somos loucos, e eu acho que a vida pode ficar mais interessante.
vc decide o que fazer com esse sonho. é seu. Só peço que seja um segredo absoluto, que vc não me faça de idiota com isso: é sincero, e eu não espero nada.
as cartas são lindas porque dizem coisas que não podem ser ditas ao vivo, por isso eu te mandei isso. tudo é diferente em carne e osso.


espero alguma resposta.
um beijo, Deni


(imagem ao topo: foto da série "Sobreposições Fotográficas", 2001, de Luise Weiss; retirada de seu blog Relatos Poéticos)

terça-feira, 19 de abril de 2011

No meio de uma estrada

me vejo vagueando
e me encontro entre dois lugares
me encontro em lugar nenhum.
uma voz me sussurra
"há cidade à frente?"
não há.

por que razão saí de minha cidade por uma mulher?
pressinto que morrerei no caminho
à alguém que desconheço.
o sacrifício já não toca os amantes,
e no meio de uma estrada constatei minha loucura.

como faço para tatear-te?
como posso te envolver no meu peito?
como vou erguer nossa morada?

se perco tempo...é possível?
se perco meus membros...é possível?
se durmo durante a noite...

a cidade à frente não me acolherá.

Deleuze e o amor




"O verdadeiro charme das pessoas reside em quando elas perdem as estribeiras, quando não sabem muito bem a que ponto estão. Não são pessoa que desmoronam, pelo contrário, nunca desmoronam. Mas se não captar a pequena marca de loucura de alguém, não pode gostar desse alguém, não pode gostar dele.É exatamente este lado que interessa. E todos nós somos um pouco dementes. Se não captar o ponto de demência da pessoa, eu temo que...aliás, eu fico feliz em constatar que o ponto de demência de alguém seja a fonte de seu charme."


Deleuze

sábado, 9 de abril de 2011

redemoinho

gosto de nós
em cordas de barcos
que rangem os ventos
cordas douradas balançam entre dedos
seus olhos tão bravos
suas portas tão lindas
balançam e batem! entre sonhos


pequeno, meu casco
asco, meu rosto
tosco, meu dente
crente, meu olho


gosto de nós, silêncio
nós entre minhas mãos de calos
e tão longe do seu toque.
Vagueia, navega, em mim
te preciso como é navegar
te domino como é viver

transmuta-se sempre
ora lá sobre cristais
ora aqui sobre fazendas
está sempre me perseguindo
içando, me sugando
redemoinho
me puxa o peito
goza sozinha, engolindo barcos


 

quarta-feira, 30 de março de 2011

Contos da Meia Noite - O Homem da Cabeça de Papelão

de João do Rio
por Maria Luisa Mendonça



quarta-feira, 23 de março de 2011

Sobre a Pornografia

Negação da solidão
boçalidade em face do anti-erotismo
nadar de roupas
procurar a nudez em-potência da imagem

anti-espelhos
os espelhos e as cópulas, disse Borges
são abomináveis pois
multiplicam os homens-
vamos multiplicar as mulheres!

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Luta de Farpas













uma luta de farpas
um desenho de riscos pretos
sangue e dor são imagens
momento em que tudo interessa
tudo é quente
tudo é bonito e faz sentido
a dor é terna e a dor é linda
e é uma luta

uma luta de farpas
de goivas a gaivotas sobre a mesa
e sujeiras no entre-unhas
fazem as mãos
fazendas e cruzes no canteiro
cantinho da morte, pequeno cemitério
...consentem gritos como pequenos ritos
e curas como caminhos certos
...tudo interessa tanto!
quando some isto?

uma luta de farpas
faz sentido gaivotas voarem;
asas de madeira gravada por metais
certos afiados que cortam farpas
gaivotas concretas cheias de espinhos de madeira
árvores e tropas, crises
ocultada, calada, a dor, regada
álcool

uma luta de farpas
presas na minha garganta
encantamentos seus não movem montanhas
movem ondas e movem poeira.
luta de farpas e
quebra de estrutura
encaixe da matéria
corte no infinito de seu corpo macio
marcas de sangue sem ódio
gotas entre trilhos de cortes
aceitação à arte
luta ...de farpas...da pele

{imagem: consentimento da dor, de Pim Lopes}

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Gato Preto Gato Branco